Heraldo Vitta

O que acontece se expirar o prazo para julgamento de um processo administrativo?

Prazo de Conclusão x Prazo Prescricional nos Processos Administrativos: Uma Distinção Essencial e Universal

A discussão sobre prazos no processo administrativo — seja tributário, ambiental, disciplinar, regulatório ou sancionador em geral — exige a distinção entre duas categorias jurídicas de natureza completamente diversa: o prazo de conclusão do procedimento e o prazo prescricional da pretensão punitiva. Embora frequentemente confundidos, tais institutos obedecem a regimes jurídicos distintos e produzem consequências diametralmente opostas.

Essa diferenciação é crucial tanto para a Administração Pública quanto para as pessoas em geral, pois envolve diretamente os princípios da eficiência, segurança jurídica, legalidade e limitação do poder sancionador estatal.

  1. O prazo de conclusão do processo administrativo: prazo interno, procedimental e organizacional

Praticamente em todas as legislações setoriais — a exemplo da Lei 9.784/1999 (processo administrativo federal), da Lei 8.112/1990 (disciplina de servidores federais), das leis estaduais/municipais correlatas, do Decreto 70.235/1972 (processo tributário federal), de normas ambientais como a Lei 9.605/1998 e seus regulamentos — há previsão de prazos internos para a conclusão dos processos administrativos.

Esses prazos têm natureza:

  • processual (não material);
  • organizacional;
  • instrumental;
  • voltada ao cumprimento da eficiência administrativa (CF, art. 37).

Sua função é ordenar a marcha do processo, evitando atrasos injustificados, mas não opera como limite substancial ao poder de punir da Administração.

Assim, ultrapassado o prazo interno (60 dias, 180 dias ou outro), a consequência não é a extinção do processo. Em geral, a Administração pode:

  • prorrogar justificadamente;
  • renovar a comissão (no caso dos processos disciplinares);
  • reabrir ou regularizar o andamento processual.

Portanto, a expiração do prazo não gera arquivamento, não extingue a pretensão punitiva e não configura prescrição. Trata-se de prazo de natureza administrativa.

  1. O prazo prescricional: limite material ao poder punitivo do Estado

Ao lado dos prazos internos, existe o prazo prescricional, que tem natureza diametralmente oposta.
A prescrição corresponde ao limite temporal para o exercício da pretensão punitiva estatal no âmbito administrativo, funcionando como verdadeira garantia de segurança jurídica e de proteção contra a perpetuação de litígios.

A prescrição pode ocorrer:

2.1. Antes da instauração do processo (prescrição inicial)

Entre a data da infração e a ciência da autoridade competente ou entre o fato e a abertura válida do processo administrativo.

2.2. Durante o processo (prescrição intercorrente)

Mesmo após a instauração formal, se houver paralisação injustificada por período superior ao prazo prescricional aplicável, consuma-se a prescrição intercorrente.

Heraldo Garcia Vitta escreveu: “O fato é que não se pode admitir, por causa da estabilidade das relações sociais e da finalidade da penalidade administrativa, a imprescritibilidade da ação punitiva do estado. A prescrição é a regra.”(A Sanção no Direito Administrativo, p.154, Malheiros, 2003).

Nos termos dos fundamentos constitucionais e legais, a prescrição extingue o poder sancionador da Administração, independentemente do estágio do processo ou da vontade da autoridade instauradora:  ao contrário, esta tem o dever de reconhecer a ocorrência da  prescrição e, assim, extinguir o processo administrativo